Tu És o Glorioso - 19

Em 1968, Botafogo campeão na famosa final da marcha à ré na volta olímpica

Atualizado em 09-06-2015 às 20h00

Por Auriel de Almeida - Historiador

A Taça Guanabara, criada em 1965 em homenagem ao IV Centenário da Cidade do Rio de Janeiro, era originalmente uma competição especial, uma versão resumida do Campeonato Carioca, disputada em apenas um turno. E valia vaga na Taça Brasil, torneio que dava ao seu vencedor o título de campeão brasileiro.

Nos primeiros anos de disputa, a Taça era a competição inaugural da temporada do Rio de Janeiro, e o Botafogo sagrou-se campeão de sua terceira edição, em 1967, ano em que o clube abocanhou todas as competições do estado – sendo as outras o Torneio Início e o Campeonato Carioca.

Em 1968 a Taça Guanabara passou a ser disputada pouco após o Estadual. E o Glorioso, bicampeão carioca, começou devagar, empatando demais, chegando à última rodada com o mesmo número de pontos que o Flamengo, seu último adversário. Só que Rubro-Negro tinha uma partida a menos, adiada, contra o então lanterninha Bonsucesso. O Botafogo precisava vencer o Fla de qualquer maneira.

Como esperado, o Flamengo não quis saber de futebol na partida contra o Bota. Jogou apenas para empatar, com sucesso, segurando o zero no placar até o fim – resultado que levou os flamenguistas no Maracanã a gritar “é campeão”, grito correspondido pelos atletas, que deram a volta olímpica sem taça. E ninguém no Botafogo ou no Rio de Janeiro achou a comemoração precipitada, pois o Rubro-Negro só precisava empatar com o fraquíssimo Bonsucesso para sagrar-se campeão. Uma verdadeira sopa, título garantido – aliás, não só o título como a vaga para a Taça Brasil daquele ano. E o conformado Botafogo viajou para Goiás, para uma série de amistosos.

Quando os dirigentes alvinegros receberam o telefonema que informou que o Flamengo perdera por 2 a 0 para o Bonsucesso, que o campeonato continuava empatado, e que era necessário um jogo-extra entre os rivais, devem ter achado que era trote. Mas não era. O Botafogo voltou às pressas para o Rio de Janeiro, com sede de título. O Rubro-Negro devia estar arrasado, e visivelmente os astros estavam do lado da Estrela Solitária.

VÍDEO DO CANAL 100



O JOGO

O Flamengo, desmoralizado, torcia para que ao menos o cansaço de viagem diminuísse o ímpeto do Alvinegro – em vão. Superior desde o início da partida, o Botafogo não deu chances a um adversário brigador e desorganizado, e pela segunda vez na temporada arrasou um rival regional por quatro gols na final - na decisão do Campeonato Carioca a vítima fora o Vasco (4 a 0).

O primeiro da conta foi conquistado através de Gérson, aos nove minutos de jogo. Paulo Cézar ganhou de Murilo na corrida, pela esquerda, e cruzou para Jairzinho, rasteiro, na marca do pênalti. Jair fez corta-luz, confundindo a defesa flamenguista inteira, e Gérson apareceu na velocidade, por trás, chutando com força para o fundo das redes de Ubirajara, que nem se mexeu: 1 a 0. O título já se desenhava a favor do Glorioso, muito cedo.

O Botafogo seguia criando, e a maioria das jogadas saíam dos pés de Paulo Cézar, que embora não tenha marcado nenhum gol na partida sairia eleito o melhor em campo no primeiro tempo. O craque simplesmente deu um baile em Nelsinho, escalado para conter o atacante, e não tomou conhecimento de Murilo e Onça, na sobra. Mas quis o destino que os botafoguenses fossem para o intervalo com a vantagem mínima no placar, desperdiçando grandes chances – na maior delas, Paulo Cézar mandou um petardo na trave de Ubirajara, que já estava batido, num dos poucos erros do craque na noite. Do lado do Flamengo, apenas duas chances criadas por Fio, bem defendidas por Cao.

Logo no início da segunda etapa o Botafogo teve a chance de ampliar, com Gérson. Jairzinho, completamente impedido, recebeu lançamento longo, o juiz Armando Marques não parou a jogada e o atacante foi derrubado na entrada da área por Ubirajara. Penalidade máxima que Gérson bateu fraco, no meio do gol, para defesa fácil do rival. Um erro que podia ser imperdoável em uma decisão.

Poucos minutos depois o Flamengo conseguiu o seu ponto, em uma jogada espetacular de Dionísio, que avançou pela esquerda, sem ser alcançado pelos marcadores, e tocou de levinho por cima do goleiro Cao, que se atirava na bola. Era o empate rubro-negro, e um castigo para o time que acabara de desperdiçar um pênalti. Mas o susto durou só quatro minutos: aos 20, Zequinha recebeu de Jairzinho, livre, correu por uma verdadeira avenida pela direita até a área e enfiou um canudo no ângulo oposto. O Bota estava na frente, de novo.

Embora a superioridade alvinegra ainda fosse visível, o Fla parecia outro time após o gol, mais valente, lutador, e quase conseguiu empatar mais uma vez com Dionísio, que cabeceou na trave aos 25 minutos – no rebote, Fio mandou para fora, de peixinho. Mas as esperanças rubro-negras morreram em minutos, quando Jairzinho penetrou pela esquerda, driblou Ubirajara e foi derrubado. Gérson foi para a cobrança do segundo pênalti e dessa vez não desperdiçou, chutando com força no canto esquerdo de Ubirajara, que quase defendeu: 3 a 1 para o Alvinegro, e o título estava bem perto.


Gérson bate o pênalti e converte: gol do Botafogo
!

O Flamengo reclamou muito aos 32 minutos, quando Carlos Roberto parou Dionísio com força, dentro da área, e o juiz nada marcou. Mas o lance nem seria reclamado após o jogo, afinal, não fez a menor falta. Especialmente depois que Jairzinho, correndo da direita, deixou Roberto Miranda na boa, de cara para o gol, e o jogador chutou com facilidade, dando números finais à peleja: 4 a 1 para o Botafogo, bicampeão da Taça Guanabara.

A dobradinha consecutiva dos títulos do Campeonato Carioca e da Taça em 1967 e 1968, que poderia muito bem ser chamada de “tetracampeonato especial”, ficou conhecida por “Bi-Bi”, e permaneceu inédita nos anos em que a Taça Guanabara foi um torneio independente. E a final inesquecível contra o Rubro-Negro, após o mesmo comemorar o título com antecedência no Maracanã, entrou para a história do Rio de Janeiro como a “marcha-a-ré na volta olímpica”. Mais uma contribuição do Glorioso para o folclore do futebol mais charmoso do Brasil.

== Ficha técnica ==

Quarta-feira, 18 de setembro de 1968
Botafogo 4 x 1 Flamengo – Local: Estádio Jornalista Mário Filho (Maracanã)
Taça Guanabara – Jogo-extra

Botafogo: Cao (Wendell), Moreira, Zé Carlos, Sebastião Leônidas (Dimas) e Waltencir; Carlos Roberto e Gérson; Zequinha, Roberto, Jairzinho e Paulo Cézar. Técnico: Zagallo.

Flamengo: Ubirajara Alcântara, Murilo, Onça (Jorge Andrade), Guilherme e Paulo Henrique; Nelsinho (Dionísio), Carlinhos, Liminha e Rodrigues Neto; Silva Batuta e Fio Maravilha. Técnico: Válter Miraglia.

Árbitro: Armando Marques (GB).
Gols: Gérson aos 9/1ºT; Dionísio aos 16/2ºT, Zequinha aos 20/2ºT, Gérson aos 29/2ºT e Roberto aos 36/2ºT.

Público: 94.535

Por Auriel de Almeida - Historiador

A Taça Guanabara, criada em 1965 em homenagem ao IV Centenário da Cidade do Rio de Janeiro, era originalmente uma competição especial, uma versão resumida do Campeonato Carioca, disputada em apenas um turno. E valia vaga na Taça Brasil, torneio que dava ao seu vencedor o título de campeão brasileiro.

Nos primeiros anos de disputa, a Taça era a competição inaugural da temporada do Rio de Janeiro, e o Botafogo sagrou-se campeão de sua terceira edição, em 1967, ano em que o clube abocanhou todas as competições do estado – sendo as outras o Torneio Início e o Campeonato Carioca.

Em 1968 a Taça Guanabara passou a ser disputada pouco após o Estadual. E o Glorioso, bicampeão carioca, começou devagar, empatando demais, chegando à última rodada com o mesmo número de pontos que o Flamengo, seu último adversário. Só que Rubro-Negro tinha uma partida a menos, adiada, contra o então lanterninha Bonsucesso. O Botafogo precisava vencer o Fla de qualquer maneira.

Como esperado, o Flamengo não quis saber de futebol na partida contra o Bota. Jogou apenas para empatar, com sucesso, segurando o zero no placar até o fim – resultado que levou os flamenguistas no Maracanã a gritar “é campeão”, grito correspondido pelos atletas, que deram a volta olímpica sem taça. E ninguém no Botafogo ou no Rio de Janeiro achou a comemoração precipitada, pois o Rubro-Negro só precisava empatar com o fraquíssimo Bonsucesso para sagrar-se campeão. Uma verdadeira sopa, título garantido – aliás, não só o título como a vaga para a Taça Brasil daquele ano. E o conformado Botafogo viajou para Goiás, para uma série de amistosos.

Quando os dirigentes alvinegros receberam o telefonema que informou que o Flamengo perdera por 2 a 0 para o Bonsucesso, que o campeonato continuava empatado, e que era necessário um jogo-extra entre os rivais, devem ter achado que era trote. Mas não era. O Botafogo voltou às pressas para o Rio de Janeiro, com sede de título. O Rubro-Negro devia estar arrasado, e visivelmente os astros estavam do lado da Estrela Solitária.

VÍDEO DO CANAL 100



O JOGO

O Flamengo, desmoralizado, torcia para que ao menos o cansaço de viagem diminuísse o ímpeto do Alvinegro – em vão. Superior desde o início da partida, o Botafogo não deu chances a um adversário brigador e desorganizado, e pela segunda vez na temporada arrasou um rival regional por quatro gols na final - na decisão do Campeonato Carioca a vítima fora o Vasco (4 a 0).

O primeiro da conta foi conquistado através de Gérson, aos nove minutos de jogo. Paulo Cézar ganhou de Murilo na corrida, pela esquerda, e cruzou para Jairzinho, rasteiro, na marca do pênalti. Jair fez corta-luz, confundindo a defesa flamenguista inteira, e Gérson apareceu na velocidade, por trás, chutando com força para o fundo das redes de Ubirajara, que nem se mexeu: 1 a 0. O título já se desenhava a favor do Glorioso, muito cedo.

O Botafogo seguia criando, e a maioria das jogadas saíam dos pés de Paulo Cézar, que embora não tenha marcado nenhum gol na partida sairia eleito o melhor em campo no primeiro tempo. O craque simplesmente deu um baile em Nelsinho, escalado para conter o atacante, e não tomou conhecimento de Murilo e Onça, na sobra. Mas quis o destino que os botafoguenses fossem para o intervalo com a vantagem mínima no placar, desperdiçando grandes chances – na maior delas, Paulo Cézar mandou um petardo na trave de Ubirajara, que já estava batido, num dos poucos erros do craque na noite. Do lado do Flamengo, apenas duas chances criadas por Fio, bem defendidas por Cao.

Logo no início da segunda etapa o Botafogo teve a chance de ampliar, com Gérson. Jairzinho, completamente impedido, recebeu lançamento longo, o juiz Armando Marques não parou a jogada e o atacante foi derrubado na entrada da área por Ubirajara. Penalidade máxima que Gérson bateu fraco, no meio do gol, para defesa fácil do rival. Um erro que podia ser imperdoável em uma decisão.

Poucos minutos depois o Flamengo conseguiu o seu ponto, em uma jogada espetacular de Dionísio, que avançou pela esquerda, sem ser alcançado pelos marcadores, e tocou de levinho por cima do goleiro Cao, que se atirava na bola. Era o empate rubro-negro, e um castigo para o time que acabara de desperdiçar um pênalti. Mas o susto durou só quatro minutos: aos 20, Zequinha recebeu de Jairzinho, livre, correu por uma verdadeira avenida pela direita até a área e enfiou um canudo no ângulo oposto. O Bota estava na frente, de novo.

Embora a superioridade alvinegra ainda fosse visível, o Fla parecia outro time após o gol, mais valente, lutador, e quase conseguiu empatar mais uma vez com Dionísio, que cabeceou na trave aos 25 minutos – no rebote, Fio mandou para fora, de peixinho. Mas as esperanças rubro-negras morreram em minutos, quando Jairzinho penetrou pela esquerda, driblou Ubirajara e foi derrubado. Gérson foi para a cobrança do segundo pênalti e dessa vez não desperdiçou, chutando com força no canto esquerdo de Ubirajara, que quase defendeu: 3 a 1 para o Alvinegro, e o título estava bem perto.


Gérson bate o pênalti e converte: gol do Botafogo
!

O Flamengo reclamou muito aos 32 minutos, quando Carlos Roberto parou Dionísio com força, dentro da área, e o juiz nada marcou. Mas o lance nem seria reclamado após o jogo, afinal, não fez a menor falta. Especialmente depois que Jairzinho, correndo da direita, deixou Roberto Miranda na boa, de cara para o gol, e o jogador chutou com facilidade, dando números finais à peleja: 4 a 1 para o Botafogo, bicampeão da Taça Guanabara.

A dobradinha consecutiva dos títulos do Campeonato Carioca e da Taça em 1967 e 1968, que poderia muito bem ser chamada de “tetracampeonato especial”, ficou conhecida por “Bi-Bi”, e permaneceu inédita nos anos em que a Taça Guanabara foi um torneio independente. E a final inesquecível contra o Rubro-Negro, após o mesmo comemorar o título com antecedência no Maracanã, entrou para a história do Rio de Janeiro como a “marcha-a-ré na volta olímpica”. Mais uma contribuição do Glorioso para o folclore do futebol mais charmoso do Brasil.

== Ficha técnica ==

Quarta-feira, 18 de setembro de 1968
Botafogo 4 x 1 Flamengo – Local: Estádio Jornalista Mário Filho (Maracanã)
Taça Guanabara – Jogo-extra

Botafogo: Cao (Wendell), Moreira, Zé Carlos, Sebastião Leônidas (Dimas) e Waltencir; Carlos Roberto e Gérson; Zequinha, Roberto, Jairzinho e Paulo Cézar. Técnico: Zagallo.

Flamengo: Ubirajara Alcântara, Murilo, Onça (Jorge Andrade), Guilherme e Paulo Henrique; Nelsinho (Dionísio), Carlinhos, Liminha e Rodrigues Neto; Silva Batuta e Fio Maravilha. Técnico: Válter Miraglia.

Árbitro: Armando Marques (GB).
Gols: Gérson aos 9/1ºT; Dionísio aos 16/2ºT, Zequinha aos 20/2ºT, Gérson aos 29/2ºT e Roberto aos 36/2ºT.

Público: 94.535